Por Klebber Maux Dias
Ronilson Ferreira dos Santos é professor e poeta, natural de João Pessoa. É doutor e mestre em Linguística. Seu primeiro livro, “[Re] Verso da Palavra”, foi publicado em 2023. O segundo, “Depois da Folha”, em 2025. A poesia de Ronilson — conhecido como Rony — não é apenas fruto de um trabalho intelectual ou técnico, mas um ato criativo impulsionado por uma força interna espontânea, que não se submete a regras rígidas ou convenções. A espontaneidade em sua criação poética permite que emoções e intuições fluam livremente, fazendo da inspiração um processo de equilíbrio entre razão e emoção, entre forma e conteúdo. Seus poemas sublimam as forças conflitantes do ser humano e expressam compaixão diante do grito social e da miséria humana.
Mãe e filho
A mãe, sentada, / embrenha o filho no meio das pernas / estende os olhos / as mãe / e a voz / a suplicar a esmola. // A criança ora chora, ora ri, / olha com os olhos de óbulo, / às vezes dorme / às vezes sonha um sonho de não saber. // E os homens passam / ignoram o quadro da miséria / pintando naquela calçada.
A criação poética, em Rony, manifesta a dignidade da dor. Mais do que comunicar sentimentos, ela afirma uma autonomia criativa frente à falta de solidariedade humana diante da mais brutal crise existencial do indivíduo ou do terrível embrutecimento social. Além disso, o poeta compreende a poesia como um processo dinâmico e vivificante — algo capaz de renovar tanto o autor quanto o leitor, despertando a sensibilidade estética e elevando a arte da compaixão. Sua obra não é fruto da ausência de disciplina, mas sim a materialização de um impulso autêntico, que Santos: compaixão diante do grito social nasce da interação entre o acolhi mento do sofrimento humano e a preservação da sensibilidade. Dessa forma, sua poética promove um não ser cruel com o mundo, com o outro e consigo mesmo.
O equilíbrio entre racionalidade e emoção é uma marca da estética de Rony. Ele não despreza as regras formais da arte, mas acredita que a criação deve nascer do sentimento interior, das intuições vindas do inconsciente, para então serem moldadas pela razão e pela técnica. Assim, a espontaneidade poética é um processo dinâmico, gerado pela dignidade da dor e pela sensibilidade mais pura do poeta, que ganha forma através do trabalho consciente. Sua inspiração poética de Rony transcende a elaboração intelectual. O poeta se conecta a um instinto criativo que lhe permite denunciar, de forma imediata e sincera, a brutalidade social, as incertezas e os sentimentos humanos. Essa espontaneidade revela o equilíbrio entre a vontade sensível — ligada ao corpo e à natureza — e a vontade racional — ligada à moralidade e ao pensamento. É essa dialética que alimenta sua poética: o poeta sente, intui e percebe, mas também reflete, organiza e reinterpreta sua experiência, criando obras que aliam senso crítico, intensidade emocional e estrutura estética.
A poesia de Rony é resultado de sua maturidade artística — uma liberdade conquistada e exercida como força transformadora. Sua poética é revolucionária na reconstrução da sensibilidade e dos afetos. Por meio dela, Rony expressa as contradições da razão e das subjetividades diante das incertezas da vida. Sua estética é um olhar artístico sobre a realidade, que nasce da capacidade de se sensibilizar com o grito social e denunciar a brutalidade humana.
Inútil
Inútil dar-me cigarro na chuva / sabendo que não fumo. // Inútil dar-me conhaque à beira mar/ sob um sol que arde. // Inútil presentear-me com flores, / se são as mesmas baratas / de todos os sábados. // Inútil botar uma música / se nem sabes dançar / a mais curta das valsas. // Inútil fazer um jantar / se não sabes temperar a comida / e muito menos botar-lhe à mesa. // Inútil viajar para lugares/ que sei cor e salteado / cores, becos, cheiros e a cama fria. // Inútil rezar para pedir ajuda, / se a crença não te habita / nem no terço que não usas. //Inútil dizer que me ama / quando a distância é perto / e não me fazes ouvir. //Inútil escrever poesia / porque as palavras não te cabem / nem nesta escrita maldita. // Nem gestos labiais farás / para mentir a leitura / que faço de ti. // Inútil te conhecer / para descobrir / o quanto sou útil.
(Artigo publicado no jornal A União, em 22 de junho de 2025))