Elmano

Por Hildeberto Barbosa Filho

Já lia Elmano Menezes no Correio das Artes dos anos 1980. Chegamos (eu, Wellington Pereira e Marcos Nicolau) a publicar os seus poemas num dos números da revista Ler. Desde então, sentia o peso de sua poesia, a solidez de sua dicção grave e sempre atenta aos temas permanentes, avessa, portanto, ao canto de sereia dos falsos experimentalismos por onde tantos se perderam. Não é com surpresa, portanto, que o vejo, agora, estrear em livro, passados tantos anos, com a publicação de “O feudo do morto” (Cajazeiras: Arribaçã, 2021). Elmano Menezes não se apressou, não cometeu o equívoco dos plumitivos contaminados pelo vão desejo das pequeninas glórias. Soube maturar seu tempo e, à margem das rodas literárias, soube explorar, no silêncio e “longe do estéril turbilhão das ruas”, as virtualidades poéticas da palavra. Seu pequeno, porém denso, livro parece um sucinto tratado sobre o tema dos temas, a morte, mesclada a outros motivos da lírica apalpados a partir de um olhar que procura atravessar a medula das coisas. Seu lirismo, como já se prenunciava, tem o tom reflexivo de um poeta que pensa, muito embora não dispense o fluxo emotivo, controlado e bem medido, que faz do poema um artefato ao mesmo tempo fechado e aberto, geométrico e flexível, esférico e preciso. Em “Escrita bárbara”, texto que escolhe para expor na contracapa, exercita o verso como que numa frase única, inteiriça, completa, em que ritmo, ideia e imagem se interpenetram numa simbiose de intensas irradiações estéticas. Transcrevo o poema: “estou sentado no terraço/ e o vento que me acolhe/ traz o cheiro da morte/ das flores e dos cravos da morte/ e o que me resta é a visão clara/ de teu corpo na água/ enquanto a manhã se vai/ pela sombra da casa/ e por fora teu corpo é ágora/ país de sombras afluente mais próximo/ do mercado de prazer à espera do bárbaro/ e não há como não se perder/ nessa paisagem de mortos/ que nada nos ensina senão/ que se pode morrer/ na próxima esquina”. Cada poema sempre encimado por uma epígrafe a testemunhar  as “afinidades eletivas” do poeta, possui sua autonomia significante, o que não impede, não obstante, de lermos os textos como um só poema, apenas seccionado em seus compassos melódicos e nas suas sugestões sinfônicas de motivações variadas. A morte rege o andamento da concepção que, enformada pela luz e pelo rigor de sua realização expressiva, não abdica de tocar os aclives dos precipícios, as cavernas mais sombrias que se abrem na geografia da alma humana. O livro de Elmano já nasce maduro, como bem percebe outro poeta de Jaguaribe e seu amigo de infância, Águia Mendes, em sugestiva nota de orelha. Elmano Menezes é campinense, mas logo cedo se radicou em João Pessoa. Formado em Letras, participou do grupo Jaguaribe Carne e iniciou sua trajetória literária no Correio das Artes.

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(Trecho de artigo publicado pelo escritor, poeta e crítico literário Hildeberto Barbosa Filho em sua coluna Letra Lúdica, do jornal A União, em junho de 2021)

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