Por Jerdivan Nobrega de Araújo
Daí que, em O IrReal e a Suspensão da Credulidade, escrevo que, embora se diga que todo penso é torto, não sinto nenhum dos meus mortos morto. (WJS. p24)
No início da semana, recebi pelos Correios o livro “Um Poema Acontece” (Editora Arribaçã, 82 pp.). Como estava de viagem marcada para Santa Catarina, resolvi levá-lo na bagagem de mão para ler durante as quatro horas de voo. Antes da partida, resolvi dar uma “passada de vista” no livro. Esse simples olhar inicial transformou-se numa leitura integral, como diz o próprio Solha, “de uma sentada”.
“Um Poema Acontece” é um tratado poético-filosófico que aprofunda inquietações metafísicas e existenciais presentes em obras anteriores do autor. Na obra, Solha funde sentimento e razão, construindo uma lógica discursiva complexa que transita entre o lírico e o filosófico, o histórico e o científico. O resultado é um vasto universo de reflexões sobre a linguagem, a criação poética e o papel do poema no mundo.
Conhecemos Solha por uma linguagem que, ao resgatar a complexidade do mundo real, a transforma pela alquimia própria dos poetas em um texto ainda mais complexo. Isso é positivo, pois desperta no leitor a necessidade de mergulhar profundamente em diversas áreas do conhecimento para compreender em plenitude sua construção poética.
Em “Um Poema Acontece”, Solha constrói um panorama plural onde o eu lírico se multiplica, transitando por personagens históricos, referências filosóficas e aspectos da experiência humana universal. O livro se configura como um longo poema que é, simultaneamente, uma intensa viagem de pensamento e sensibilidade.
O autor desafia os limites da narrativa convencional para explorar temas como a mortalidade, a transcendência, as contradições da existência e a vida pós-morte. Para Solha, escrever é uma necessidade vital e estética. Seu trabalho se destaca pela habilidade de harmonizar paradoxos, pela riqueza conceitual e por um impulso criativo que desafia estereótipos, buscando sempre uma linguagem viva, intensa e renovada — uma linguagem que “acontece” no instante da leitura e da experiência poética.
Dessa forma, “Um Poema Acontece” é uma obra que exige do leitor uma imersão ativa e reflexiva. Revela-se um poema em movimento, no qual o sentido se constrói frequentemente na tensão entre clareza e enigma, emoção e raciocínio. Essa característica faz da leitura uma dinâmica de descobertas e momentos de espanto.
Jerdivan Nóbrega é escritor e historiador paraibano.