Em finais do século de XIX e na primeira metade do século XX, dentre as muitas vozes femininas que afirmaram seu discurso e empreenderam o combate contra a discriminação feminina e sua função social, assistiu-se a luta da escritora Sara Beirão, jovem oriunda de família esclarecida que lhe propiciou educação, reconhecendo, de certa forma, o legítimo direito da mulher à cultura letrada, abrindo as portas de um nicho antes reservado aos do sexo masculino. Beirão empreendeu uma campanha por escolas para meninas, escreveu sobre vários temas, jornalística e literariamente, além de presidir ao Conselho Nacional das Mulheres portuguesas.
Escrevendo, inclusive, no jornal de propriedade de seu pai, Sara Beirão não hesitou em juntar-se a outras mulheres aguerridas como ela, na prosperidade e em uma luta que, para a surpresa de todos, ainda se faz urgente e necessária. O pioneirismo de mulheres como Gonta Colaço, Maria Archer, Ana de Castro Osório, Maria Amélia Vaz, Alice Pestana e a própria Sara Beirão ecoa ainda fortemente nas lutas de feministas e especialistas em políticas de gênero em geral, evidenciando a necessidade de uma tomada de consciência cada vez maior. Alertar a sociedade contra a discriminação e o apoucamento do importante papel social da mulher, além de indispensável, é atitude crucial, exigida de todos os cidadãos.
Essa luta não se restringe exclusivamente à mulher, mas aos seres humanos sem distinção de ideologias e outros parâmetros discriminatórios.
Identificada com esses ideais, Thalyta Alves abraçou a pesquisa da professora Aldinida, alargando o universo de discussões sobre os temas cada vez mais atuais. Elegendo dois romances da autora, Sozinha e Um divórcio, Thalyta investiga o comportamento de Júlia, espécie de Quina do início do século, recorrendo aqui à personagem do romance A Sibila, de Agustina Bessa Luís, mulher que se não desenhou para o matrimônio, nem para a militância subserviente do amanho dólar, a criação dos filhos e a submissão ao dito dono da casa. Júlia defendia o direito ao estudo e ao trabalho, invocando sempre a máxima que afirma não se poder sentir livre quem recebe o pão das mãos de outrem. Trabalhar para garantir a sobrevivência, era a norma da personagem.
No romance Um Divórcio, o próprio título já representaria uma atitude ousada, descabida, que parte de Ofélia. Embora o divórcio tenha chegado em 1910 e o livro de Beirão publicado em 1950, com quarenta anos de distância, era o processo ainda novo na católica e conservadora sociedade lusitana. A pesquisa contou com estudos voltados à temática, bem como com a orientação segura das professoras Aldinida Medeiros, Isabel Lousada, bem como as discussões com o grupo de pesquisas, o que permitiu um avanço significativo no trabalho.
Excelente exemplo de uma dissertação bem conseguida, a pesquisa de Thalyta Alves, agora em livro, contribui para os estudos de gênero nas suas vertentes, assim como honra o quadro de textos acadêmicos produzidos pelo PPGLI/UEPB.
Aqui fica o convite para a proveitosa leitura de um texto de mulheres que não recuaram e fizeram dos reveses um grito: AVANTE.
Zuleide Duarte, Casa Forte, 2/8/2025.
