Yuqueri: poesia de resistência, denúncia e luta.

Por Douglas Oliveira

 

Todo leitor tem o seu ponto fraco, uma área em que se revela limitado. O meu é a poesia de fruição, pois diante dela me sinto num interregno entre ignorância e desinteresse. Para me tocar a poesia deve ser de resistência, na melhor acepção bosiana. E é neste gênero que entendo o recente livro de Adrienne Savazoni, Yuqueri, um verdadeiro manifesto em defesa do mais ameaçado dos biomas brasileiros, o cerrado.

Ele é ambientado no ‘país’ que é mistura de cerrado e loucura, a região de Franco da Rocha onde a autora passou sua infância. Tal como a canção de Djavan, nos leva de volta ao cerrado e fica impossível não lamentarmos, com ela, o esfacelamento de um mundo.

A obra tem o mérito de ser a primeira grande apreensão estética surgida após o incêndio que devastou o Parque do Juquery, em agosto de 2021. Mas Adrienne vai além ao identificar que o descaso das autoridades e a agonia das águas e espécies são anteriores às chamas que transformaram em lenha 85% daquela vegetação.

Ao longo dos poemas se entrelaçam memória, biografia e história. Aos poucos somos tocados por lendas, imagens, sons e odores que povoam o imaginário de alguém que cresceu próxima ao pátio dos loucos e em meio a uma rica fauna,  árvores retorcidas e rios outrora caudalosos.

As portas do hospital psiquiátrico mais conhecido do país são reabertas e nele encontramos, dentre outras coisas, um Franco da Rocha humanizado e a arte visceral de Aurora Cursino, a ‘Frida Khalo do Juquery’.

Este libelo da poesia de resistência não deixou de registrar a tenacidade indígena ante às forças que buscavam a escravização de nossos povos originários. Nesta parte do cerrado uns lutaram para se manter livres, enquanto outros se desdobraram para suportar os aviltamentos de suas mentes e de seus corpos.

À qualidade dos poemas soma-se as ilustrações de Ana Cecília, a talentosa filha da autora. Yuqueri é um livro que se faz necessário após quatro anos de um governo da morte que estimulou queimadas, genocídio indígena e cultura manicomial. É poesia que faz sentir e pensar. É poesia de resistência e denúncia, poesia de luta.

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O livro “Yuqueri”, de Adrienne Savazoni, pode ser adquirido AQUI

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